Em 1988, a CF deu origem ao ICMS, acabou com imposto único à época. Em 2001, vieram PIS, Cofins e Cide, há um acúmulo de tributos na área. Deve ser revisto na reforma tributária
Leia o artigo de Adriano Pires*
O mercado de combustíveis vem passando por um amplo debate, principalmente, após a adoção da nova política de preços nas refinarias, pela Petrobras. As discussões passam, inevitavelmente, pelo sistema tributário, que acaba influenciando o setor de distribuição.
Inclusive, grande parte do preço final da gasolina e do diesel é oriunda de tributos federais e estaduais. Segundo a Petrobras, em média, 45% da composição do preço da gasolina é de impostos e contribuições.
Antes de 1988, para a tributação dos combustíveis, valia o que definia a Lei Constitucional de 20 de setembro de 1940, que alterou o artigo 20 da Constituição Federal de 1937, e determinou que apenas a União tivesse competência de tributar a produção, comércio, distribuição, consumo e importação de combustíveis.
Coube, então, ao Decreto-lei nº 2.615/40 estabelecer o IUCL (Imposto Único sobre Combustíveis e Lubrificantes) (importados e produzidos no país), que valeu até a CF de 88, quase 50 anos.
É verdade que houve mudanças na incidência do IUCL ao longo desse tempo. Por exemplo, dois anos após a criação da Petrobras, em 1955, houve a transformação da incidência do IUCL em ad valorem, incidindo apenas sobre o valor agregado dos derivados no país.
Outra modificação relevante, essa em 1964, foi que as alíquotas do IUCL passaram a incidir sobre o preço ex-refinaria, sendo esse fixado periodicamente pelo Conselho Nacional de Petróleo (CNP).
Em paralelo, o IVC (Imposto sobre Vendas e Consignações), que tinha incidência em cascata, incidindo sobre todas as fases da circulação de mercadorias –foi substituído pelo ICM (Imposto sobre Circulação de Mercadorias), que incidia sobre o valor agregado e foram criados, em 1970, o PIS e o PASEP, que incidiam de forma múltipla e acumulativa sobre o faturamento das empresas, aumentando o efeito em cascata sobre os combustíveis.
Esse processo de inchamento de tributos culminou, em 1980, com a adição, ao preço ex-refinaria, do Finsocial (Fundo de Investimento Social).
A estrutura que se tinha, então, era de um imposto único sobre os combustíveis, de exclusividade da União, que ao longo do tempo foi acrescido de novos tributos, também exclusivos da União, mas que se destinavam aos mais diversos fins, desde a internalização de custos sociais à participação da receita bruta da Petrobras, e a repasses gradativos a Estados e Municípios.
A Constituição de 1988 extinguiu o IUCL e instituiu ICMS no lugar do ICM, que passou a incidir sobre os combustíveis e lubrificantes e sobre as importações, transferindo aos Estados a competência de tributar a circulação de combustíveis em seu território de acordo com a alíquota definida por cada um deles.
Ou seja, a CF de 88 acabou com um sistema de imposto único, centrado na União, para algo descentralizado, e não mais monofásico, que é o ICMS. Portanto, é inegável a influência dos Estados na reordenação dos mercados de combustíveis e, consequentemente, na política energética nacional, ao longo dos últimos 20 anos.
Mais recentemente, a Emenda Constitucional 33/01 concedeu à União o direito da cobrança das contribuições sociais PIS/Cofins, além da Cide, sobre os combustíveis, e seguindo o artigo 149 da CF/88, não era vedado que essas contribuições fossem cumulativas.
O que temos hoje é um acúmulo de tributos sobre os combustíveis, consequente de mudanças no sistema tributário, mas que não acompanhou as necessidades do setor, e pior, contribuiu para distorcer preços e determinar a viabilidade econômica de projetos.
Hoje, com os preços livres e com acúmulo de tributos sobre os combustíveis, a situação do setor começa a ficar insustentável, deixando claro que a tributação sobre os combustíveis no país precisa ser revista. O combate a sonegação precisa e deve ser uma das prioridades do novo governo.
A competição entre estados usando a política tributária, em particular o ICMS, distorcem completamente a lógica de mercado dando sinais econômicos, que ao invés de incentivar os investimentos e empresas idôneas, estimula a sonegação e empresas que so trazem danos ao consumidor e aos cofres públicos.
A reforma tributária deve ser feita de forma a permitir que o planejamento e as políticas não tenham os impostos como um dos principais condicionantes e determinantes dos retornos dos projetos.
Com o atual nível e quantidade de impostos não há fiscalização que consiga combater a sonegação. E preciso que os estados tenham um entendimento que não será através de uma sanha arrecadatória que a crise fiscal será resolvida.
*Adriano Pires é sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE). Doutor em Economia Industrial pela Universidade Paris XIII (1987), Mestre em Planejamento Energético pela COPPE/UFRJ (1983) e Economista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1980). Atua há mais de 30 anos na área de energia
Fonte: Poder360/Fenafisco
26 de Novembro de 2024 às 11:40